quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

encontro no deserto

A Namíbia tem apenas dois milhões de habitantes. Cercada pela África do Sul ao sul, Botsuana a leste e Angola ao norte, o país é um grande deserto, com dunas a perder de vista e uma ou duas almas perdidas no meio do caminho.

Por isso fiquei surpresa quando um cara me chamou para sair em Swakopmund, uma das cidades mais turísticas do país e meca de esportes radicais. Quer dizer, quais as chances de ser chamada num date num país que tem só dois milhões de pessoas? Ah, as surpresas das viagens.

Era uma terça-feira. Estava num mini-cruzeiro em Walvis Bay: eu, três casais de franceses que já haviam passado dos 50 anos, o guia M., que era filho de franceses nascido em Kinshasa, no Congo, e o capitão do barco, um cara caricato que tinha lutado na guerra em Angola.

Entre uma explicação e outra para os franceses, eu e M. começamos a conversar. Pense no Danny de Vito. Agora tire o pouco cabelo que lhe resta. Pois é, esse era M. Mas o papo era bom: me contou que passava mais tempo na estrada do que em casa, que nas férias tudo que ele queria era ficar quieto, mas que depois de um tempo começava a bater um desespero de viajar de novo. Vida dura, mas viciante. Falei que estava planejando um safári em Botsuana, se ele tinha dicas. Ele disse que tinha, mas por que a gente não se encontrava à noite para jantar e conversar?

“Sem segundas intenções, só para trocarmos figurinhas de viagens”, ele me garantiu.

O mini-cruzeiro acabou, descemos do barco e trocamos números. Ele me disse que provavelmente ia estar livre depois das 18h, porque estava em função dos franceses, mas para eu ligar quando tivesse acabado minha programação do dia.

Liguei lá pelas 18h30. Confesso que disquei o prefixo 264 sem muita firmeza, porque com aquele monte de areia e escassez de gente da Namíbia, se ele me levasse pra algum lugar e resolvesse me esquartejar, ia ser fácil esconder meus pedacinhos e ninguém nunca ia perceber.

Quase 19h30 M. chega no hotel para me buscar. De van. Sabe aquelas vans imensas, que comportam uma família de 15, com cachorro e papagaio? Pois é. Achei engraçadíssimo ir com aquela van gigante num restaurante. Ele foi o caminho todo se desculpando, porque como estava cobrindo para um colega que estava doente não tinha dado tempo de pegar o carro dele. Eu falei que estava achando tudo ótimo. E estava mesmo.

"Sabe que eu tinha que jantar com os franceses, mas perguntei se eles podiam me liberar. Eles na hora sacaram que era para sair com você. Deram uma risadinha e falaram: vai aproveitar a noite!"

O restaurante, chamado Tug, era uma delícia. À beira-mar, concorridíssimo. Lista de espera de uma semana, mas como ele é guia e leva todos os turistas lá, conseguiu uma mesa em cinco minutos. A garçonete, que provavelmente era amiga dele, nos levou até a mesa e deu uma piscada com cara de "Vai faturar hoje, hein?". Eu fingi que não vi.

O vinho estava maravilhoso, a comida melhor ainda. E quanto mais conversávamos e dávamos risada, mais víamos que não ia rolar nada.

No final do jantar, ele já estava me contando que "lógico que rolava sexo com as clientes", que muitas mulheres que viajam sozinhas têm fetiche com guias turísticos, fenômeno conhecido no meio como "khaki fever" (por causa da cor dos uniformes) e que a mulher mais velha por quem ele já havia sido cantado era uma francesa de 65 anos, que ele não topou "por razões óbvias", mas que esclareceu muitas dúvidas que ele tinha sobre o sexo frágil.

Pedimos a conta - que ele fez questão de pagar e que lhe rendeu alguns brownie points, mas não suficientes -, entramos no quase-trailer e fomos embora. Às 10h da noite, a mega van era o único carro na estrada deserta entre Swakopmund e Walvis Bay. Fomos parados numa posto policial e o guarda, depois de examinar os documentos, deu aquela risadinha de "Vai se dar bem hoje, hein!" Eu fiz minha melhor cara de paisagem e esperei ele liberar a gente.

Quinze minutos depois, estávamos de volta no meu hotel. Ele me abraçou, agradeceu o jantar e disse que tinha gostado muita da companhia. Eu disse o mesmo, de verdade, e desejei feliz aniversário adiantado (o aniversário dele de 42 anos era dali dois dias). Fui para o meu quarto, ele entrou na van e sumiu na estrada escura.

E esse é o fim da história do meu encontro no deserto. No final das contas, nós dois faturamos. Talvez não no sentido sugerido pelas risadinhas e piscadelas, mas tem vezes que dizer sim traz outras coisas: bom vinho, boa comida, boa companhia. E só. E naquela noite, era tudo o que nós dois precisávamos.

2 comentários:

Thais disse...

Namíbia!! é das minhas!! =)
www.avidaaposaafrica.blogspot.net

Euaqui disse...

Ó, currrti! Afinal, pra que mesmo que estamos dizendo sim? beijooooooooooooooooooooooooo